Mostrar mensagens com a etiqueta pré-escolar. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta pré-escolar. Mostrar todas as mensagens

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

A Psicopatia na Infância

Muitas vezes, ao longo da nossa prática clínica e acompanhamento de casos deparamo-nos com situações difíceis. Difíceis pois existem muitas pessoas envolvidas, difíceis pelo sofrimento que causam, difíceis porque percebemos as problemáticas que futuramente daí poderão advir. Há crianças que reagem com agressividade de forma reactiva. Há crianças que usam a agressividade porque mimetizaram comportamentos em casa. Mas o facto é que existe uma pequena franja de crianças que sofre de uma outra condição. 

A psicopatia em crianças pequenas não é assim tão frequente mas existe. Existem casos muito dolorosos de crianças que assassinam outras crianças ou até familiares em casa, sem sentirem qualquer remorso pelo sucedido. Começamos a pensar neste diagnóstico quando a criança possui uma persistente incapacidade de sentir empatia pelos outros, principalmente quando os outros estão feridos ou sentem dores. Isto aliado à crueldade para com animais ou outras crianças começa a dar-nos contornos preocupantes. Para alguns especialistas é possível começar a identificar traços de psicopatia em crianças a partir dos 3 anos. Outros dizem não ser possível por ainda não haver personalidade formada. 



A questão é que longe vai o tempo em que a Psicanálise atribuía este comportamento apenas à educação e à sociedade. Actualmente, com os novos estudos e desenvolvimentos na área das Neurociências sabe-se que os distúrbios no sistema límbico (cérebro) podem levar ao aparecimento destes quadros em idades bastante precoces.  A psiquiatra Ana Beatriz Silva (livro Mentes Perigosas) diz mesmo que essas crianças e adolescentes podem estar por detrás dos mais graves episódios de Bullying conhecidos. Estas crianças cedo aprendem a mentir (atribuindo a culpa a outros, dizendo que foram agredidos e não agrediram) e a manipular emocionalmente os familiares e educadores (abraçando, dando beijinhos) de forma a conseguirem que a culpa não lhes seja imputada. 

O psiquiatra Fábio Barbirato (Brasil) e Stephen Scott (Instituto de Psiquiatria em Londres) afirmam que a partir dos 3 anos de idade se conseguem perceber estes traços de psicopatia em crianças. As crianças com transtorno de comportamento antissocial "não conseguem entender ou estar na pele de outra pessoa, são insensíveis e simplesmente não se importam". (Stephen Scott). Estudos mostram que os principais indícios que nos dizem que uma criança pode sofrer desta condição são os seguintes (a criança não tem de apresentar todos os sintomas da lista):

- mentem e, com o tempo, as mentiram vão sendo mais elaboradas
- tentam manipular emocionalmente ou fazer chantagem
- podem roubar
- praticam maldades contra amigos e/ou familiares sem arrependimento
- maltratam, torturam e até matam animais 
- não toleram frustração
- explodem ao serem contrariados
- culpam os outros pelos seus erros
- são egocêntricos
- não são solidários com os amigos 
- têm dificuldade em fazer amigos
- são arrogantes até com os familiares, ofendendo muitas vezes
- demonstram prazer ao ferir alguém, muitas vezes sorrindo
- cometem actos de vandalismo

Segundo Essi Viding (University College London) este problema não tem de estar ligado a maus tratos ou abusos existindo uma vulnerabilidade genética. Claro que o papel ambiental não pode ficar de fora. As crianças podem tornar-se ansiosas, desconfiadas e agressivas se não se sentirem seguras e protegidas pelos pais nos primeiros tempos de vida. Crianças seguras, sentem-se seguras no exterior e são mais adaptáveis. 



Mary Flora Bell (Inglaterra) é o caso mundialmente mais conhecido e divulgado desta problemática. Aos 4 anos a menina tentou estrangular um amigo e aos 10 matou duas crianças de 3 e 4 anos deixando o mundo perplexo. Mary Bell ficou 11 anos presa numa instituição psiquiátrica tendo alta em 1980. Muitos outros casos existem pelo Mundo deixando familiares e terapeutas de luto. Estas crianças precisam de acompanhamento médico e psicoterapêutico desde cedo e a atenção aos sintomas é a chave para uma melhor integração e prognóstico futuro.


Tatiana Santos
Psicóloga Clínica



domingo, 30 de agosto de 2015

O Mutismo Selectivo em Idade Precoce

Em primeiro lugar convém explicar afinal o que é isto de "mutismo selectivo". Até porque se tratam de crianças que, em casa, falam sem problemas e apenas não o fazem na presença de estranhos ou de outros ambientes particulares. Este tipo de mutismo pode ser compreendido como um medo de falar de forma espontânea, que surge sobretudo em contextos externos ao ambiente familiar e que se pode prolongar até à fase da adolescência. Para os especialistas, este tipo de mutismo selectivo surge como uma perturbação de ansiedade que ocorre normalmente nas crianças mais pequenas (3 anos de idade). Contudo, as queixas costumam ser acentuadas mais no final do pré-escolar e início do 1.º ciclo devido às dinâmicas de sala de aula. 

É também nesta idade que as crianças têm mais dificuldade em estabelecer contactos com pessoas estranhas à família. Falamos de crianças que não têm efectivamente qualquer perturbação da linguagem ou atraso cognitivo. Não falam devido ao medo/ansiedade que sentem perante estranhos ou pessoas com as quais não se sentem à vontade.



Este problema acaba por interferir na realização escolar e na comunicação social. Devemos perceber se ocorre apenas no momento de transição, quando da entrada da criança para a escola (pois há um período adaptativo em que muitas mudanças têm lugar) ou se a situação se prolonga. Quando este mutismo se prolonga no tempo e começa a aplicar-se a praticamente todas as pessoas com excepção dos pais / cuidadores, a integridade física e mental da criança fica em risco. Surgem dificuldades na avaliação educativa destas crianças, os amigos afastam-se durante as brincadeiras sociais, a auto-estima diminui e até a sua saúde física pode ficar comprometida já que estes/as meninos/as evitam pedir aos educadores para ir à casa-de-banho, dizer que têm fome ou sede, etc. Normalmente falamos de crianças tímidas, inseguras, perfeccionistas. Comunicam essencialmente através de gestos e se usarem a fala, fazem-no num volume muito baixo (até ao ouvido).

Os papás destas crianças devem procurar estimular a comunicação desde cedo, evitar o uso de expressões depreciativas ("não tens vergonha"), evitar falar do problema com outras pessoas à sua frente, não obrigar a criança a falar quando esta se recusa, não se zangar ou castigar a criança devido a este comportamento, sempre que a criança falar baixinho responder "não consigo ouvir" para tentar que fale mais alto, dar tarefas à sua criança tais como recados em que tem de pedir coisas a alguém, convidar amigos para irem a sua casa de forma a que a criança tenha mais contacto com diferentes pessoas, colocar a criança em actividades extra-curriculares (ATLs) e ter alguma paciência para não forçar a mudança dando ao seu filho o tempo que necessita. 


Os Educadores destes meninos devem dar-lhes tempo, criar um ambiente descontraído e livre de stress, usar expressões encorajadoras ("tens tempo", "se não falares hoje, falas amanhã"), não deixar que outros meninos falem na sua vez, incentivar a interacção social colocando estas crianças primeiro em pequenos grupos, evitar rótulos, contar histórias de meninos que têm medo de falar mas conseguem vencer o problema, reforçar positivamente todas as intervenções da criança, ter calma, paciência e atribuir-lhe tarefas de responsabilidade na sala para que possa ir ganhando segurança.

O apoio psicológico é uma mais valia, sobretudo se feito em equipa junto com os pais, educadoras e auxiliares.  


Tatiana Santos
Psicóloga Clínica